AILA é um jogo brasileiro de terror desenvolvido pela Pulsatrix Studios, o mesmo estúdio responsável pelo excelente Fobia – St. Dinfna Hotel, e deixa claro desde os primeiros minutos que o horror já faz parte do DNA da equipe. Assim como no projeto anterior, a inspiração em Resident Evil é evidente (e assumida), com uma experiência em primeira pessoa que mistura exploração, monstros, armas de fogo, combate corpo a corpo, quebra-cabeças ambientais, inventário limitado, combinação de itens e bastante backtracking - portanto, para quem gosta de um jogo clássico do gênero survival horror, é impossível não se sentir em casa.
O jogo conta com um elenco de destaque, e vale ressaltar que
a dublagem original é em português. Outros idiomas aparecem como
localizações terceirizadas, conforme comentado pelo diretor criativo do jogo, o
youtuber Max MRM, em participação no podcast Debyte. Curiosamente,
bilhetes, textos e jornais espalhados pelo cenário estão todos em inglês,
criando uma mistura de idiomas que se repete por toda a ambientação.
A história é, sem dúvida, um dos pontos mais fortes de AILA: você controla Samuel, um profissional que trabalha com jogos, tecnologia e
robótica, que mora sozinho em um apartamento e possui um gato como companhia. A cidade
onde ele vive lembra muito uma versão de Night City, de Cyberpunk
2077, só que sem o neon, sem vida e sem cor — tudo é cinza, chuvoso e
opressivo. A trama realmente engrena quando Samuel é convidado a testar AILA,
uma inteligência artificial executada em um hardware de realidade virtual. A IA
cria cenários semelhantes a jogos e passa a aprender com suas reações,
sentimentos e decisões. A partir daí, a relação entre Samuel e AILA começa a
sair do controle, em uma narrativa que se desdobra em sete finais diferentes,
todos dependentes das escolhas do jogador.
Em determinado ponto, o jogo até brinca com a pergunta: quem
é realmente o protagonista da história, Samuel ou AILA? Essa dúvida não é
gratuita. A estrutura narrativa é extremamente inteligente, colocando o jogador
em diferentes cenários, mecânicas e ambientações como se estivesse vivenciando
vários jogos dentro de um só. Ainda assim, tudo é muito bem amarrado por uma
narrativa central forte, que dá sentido a essas mudanças constantes e
transforma a experiência em algo surpreendentemente coeso.
Visualmente, AILA não chega a ser impressionante, mas
entrega gráficos bonitos feitos na Unreal Engine 5. O jogo é consideravelmente
mais pesado do que deveria ser, chegando a rodar pior do que títulos como Assassin’s
Creed Shadows e Cyberpunk 2077, mesmo tendo uma fidelidade visual
inferior. Testei o jogo tanto em um PC relativamente potente quanto em um
portátil Ayaneo com processador Ryzen 7 6800U rodando Windows 11, e neste
último a experiência simplesmente não se sustentou.
Alguns assets do jogo parecem genéricos ou
importados, enquanto outros são claramente easter eggs deixados pela
equipe. E aqui vale um destaque especial: a quantidade de referências é
absurda. AILA está recheado de piadas internas, menções a influenciadores de
games, referências a outros jogos, cultura nerd e até memes da internet. Para
quem gosta de prestar atenção nos detalhes, isso rende vários sorrisos ao longo
da jogatina.
Nem tudo são flores. O jogo apresenta bugs ocasionais,
incluindo problemas gráficos, falhas de mira e inconsistências na interação com
objetos. Além disso, AILA é um jogo difícil — e em alguns momentos, essa
dificuldade beira o frustrante. Em uma luta específica contra um chefe, tive a
clara sensação de que algo estava errado: não era possível saber se os tiros
estavam acertando, se o inimigo estava bugado ou se o jogo estava simplesmente
sendo injusto. Após várias tentativas, recuei até uma cabana próxima e, de
forma curiosa, um baú dropou cerca de 50 balas de pistola e mais de vinte de
escopeta. Não sei dizer se foi um bug ou se o jogo decidiu me dar uma ajuda
silenciosa.
Por fim, é importante destacar o excelente trabalho da
Pulsatrix junto à publisher para garantir que AILA chegasse ao Brasil com
um preço justo e competitivo. Sendo um jogo indie, com escopo naturalmente
limitado por orçamento, ele jamais faria sentido a preço cheio. O valor padrão
de cerca de 90 reais já é bastante atrativo, e na promoção de lançamento paguei
apenas 65 reais — um preço excelente para um jogo que, apesar dos problemas
técnicos, é muito bom e extremamente ambicioso no que se propõe a fazer.
AILA é um survival horror brasileiro que merece atenção,
tanto pela coragem narrativa quanto pela identidade própria que constrói a
partir de influências claras. Não é perfeito, mas é marcante, ousado e prova
que o terror nacional está cada vez mais interessante.
AILA está disponível para PC (Steam), Xbox Series X|S e PlayStation 5.

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